terça-feira, 1 de janeiro de 2019

01.01

Primeiro escrito
de 2019
nas últimas páginas do caderninho
que vem comigo desde 2017.
O novo que se abre,
o velho que se encerra.

Começar e acabar
abrir e fechar

começo e fim
juntos

Observo com gosto
 a ironia e o paradoxo
da existência.

Não é exatamente
esse o movimento
da vida?

Folha que cai
semente que brota.

Tanto a apreciar.


terça-feira, 20 de novembro de 2018

Poema de hoje - 20.11.28


sentir-se inevitavelmente só
apesar de tantos comigo
tantos em mim

sobrepeso de ideias
e palavras por onde
escoá-las
não encontro mais
facilmente

podia falar de tanta coisa
mas insisto
mesmo tema de sempre
ausência de poema
dificuldade de escrita
na adultez atual

já há anos que essa
atualidade me habita
e na realidade sigo escrevendo
até hoje
até agora
neste momento

a escrita muda tanto quanto
a gente

e seguimos, ela e eu
inevitavelmente
sós
um pro outro

maneira de ser sozinho
maneira de estar com todos
quando escrevo posso ser tudo
se escrevo, há todos
em mim e comigo

soltar o pensamento nos dedos
quer seja por lápis, caneta
ou por teclas
mas em movimento

soltar o pensamento
de mim

sair-se
de
si
no
ins
tan
te


para saber ser algo entre
mais e menos

por que escrever continua sendo ambos
dor  e remédio?

adentrar-se e
abster-se de si
num só tempo

criar outros
outras
coisas tantas além

movimento nuvem
sombra cheia e vazia
usando letras
escrever o que não cabe
na linguagem
como?
ventania e
silêncio

tons de cinza
branco e preto
hoje me são
mais do que eu

enquanto o corpo
febril
alucina
querendo algum tesão
sem nome

sem linguagem
comunicar-se
por entre aléns

deixar solto
o centro do corpo
emanando algo
invisível

poema que dói
porque nunca
termina
igual transar
sem gozar
mas não
infelizmente





terça-feira, 10 de julho de 2018

Juqueí - Julho 2018


Estar aqui traz muitas lembranças.
Logo que entrei fiquei emocionado, ao ver os pratos, louça antiga, uma estante de madeira, marcas aconchegantes dos encontros com tio Ronaldo, tia Sonia, Gab e Ju.
Fiquei com muita saudade do meu tio, especialmente, e senti que gostaria muito de estar com ele agora, tomar uma cerveja ou um vinho, fazer um rango, conversar.
Como a morte pode ser triste, às vezes, quando imaginamos como seria se a pessoa querida ainda estivesse aqui. Sobre o que conversaríamos? Do que daríamos risada?
A morte da Juju recentemente foi uma espécie de gota d’água pra mim, um alarme que soou internamente e me disse que não dá mais pra ficar de lenga-lenga, temos que aproveitar tudo ao máximo. Não há amanhã. E temos que desfrutar da presença de pessoas queridas o máximo possível. Vibrar em alegria juntos, tanto quanto puder, deixando cair possíveis besteiras e receios, medos e ranços que possam existir.
O maior clichê do mundo é verdade: a vida é muito curta pra ficar dando corda pra besteirada da mente e das relações. Que caiam todas as mágoas e desavenças. Que possamos vibrar no encontro, em alegria, e que possa haver diálogo e criação.
É essa reflexão maior que me vem depois da morte da Julia, e é bem por aí que eu gostaria de caminhar a partir de agora. Estar aqui pra mim é um descanso, um repouso absolutamente necessário depois desses meses – mas é também um reencontro, um luto, um interlúdio silencioso que precisava há muito.
Um reencontro com o mar, com o sol, com a areia e os ventos que vem do oceano. Um reencontro com Hermann Hesse, e a lembrança daquele primeiro encontro de 2004, quando pela primeira vez li, aqui, também em julho, Demian e Sidarta.
Estar aqui é um luto, que só posso viver solitário, mesmo que sem lágrimas nem nada demais. Mas ainda assim, uma possibilidade de. Um perceber-me na quietude, sem ninguém por perto – um escancarar-me a mim mesmo, tal qual nos faz a parede do zazen.
Estar aqui dessa vez e desse modo é umas férias preciosas para poder também achar em mim o espaço de criar algo novo, ou de continuar criando o que já quero, mas não há corpo. Somente com o descanso é possível preparar os ossos e os músculos e assim separar o ritmo da marcha que vinha vindo até aqui. Sensibilizar o corpo, sensibilizar o coração e a mente mais uma vez, e só com o repouso e o ócio isso é possível.
Estar aqui hoje é esse interlúdio entre uma responsabilidade e outra, para um talvez perceber uma responsabilidade maior: viver deliberadamente, com poesia e sem medo da morte.
Entrar no mar todos os dias traz-me isso novamente, traz-me a mim, traz-me à vida.
Reencontro com o mar, mestre, mãe. E com a saudade, gratidão que nunca termina.

domingo, 18 de fevereiro de 2018

De tão fenomenal



De tão fenomenal

O que eu faço da minha vida de tão fenomenal que não posso parar uns minutos e olhar pra minha avó com carinho, para os vizinhos tão generosos, para um amigo ou outro distante mas não menos querido, para meu pai que tanto se esforça na vida, para o céu que sempre oferece alívio, para o chão que sempre oferece beleza apesar da sujeira.
O que eu faço da minha vida de tão fenomenal que me faz querer ainda mais, quando nada basta, nenhum encontro, nenhum olhar palavra abraço beijo afago trepada serve, porque mal serve pra aliviar – que eu faço? Se minha vida de tão fenomenal não se basta, quanto mais um pequeno encontro de amigo, quando acontece, se acontece (em meio a essa cidade que tanto impede). Que eu faço de tão incrível que não cabe mais nenhum poema, mas cabe horas no smartphone esperando o busão, cabe uma respiração falha que não preenche o corpo, cabe minuto atrás de minuto enrolando o cabelo e pensando corto ou não corto, corto ou não corto, corto ou não corto.

Lembro

Lembro



lembro – e acho tão difícil saber o que é lembrar e o que é imaginar – das tantas noites que adormeci em cima de você, num sono incontrolável e belo. a gente pelado e o sexo que era tão outra coisa, antes de dormir sem nem perceber. quando de repente acordava, estava ainda dentro de ti. seus braços que tão ternamente me acolhiam, e eu que delirava por estar ali também te acolhendo. a chuva que cai pesada lá fora, o escuro, o calor que emana da gente, o tesão de poder ser tudo sem ter que ser nada, e sermos. pelados, e tua nudez que me era tão outra coisa, que me vociferava e ao mesmo tempo enternecia. que tesão é esse que assola e reconforta a um só tempo? chuva pesada lá fora, delírio leve aqui dentro.
já te escrevi isso, já publiquei isso, já te enviei e reenviei isso: quando te ver acordar me faz descrer estar acordado, quando tua nudez me assola pelo resto do dia, pelo resto dos dias. e parece que nada adiantou, a não ser praquela época, praquela época. agora eu só imagino, continuo louco e terno como era quando você comigo. e sigo sem saber se o que eu sinto é saudade: de ontem ou de amanhã.



quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

POEMA SOB ENCOMENDA para o ano novo que se abre



POEMA SOB ENCOMENDA
para o ano novo que se abre


Auspícios se fazem
bons
quando do pensamento
correto brotam.

Silêncio.

O ano que se abre
só é novo
e genuinamente
aberto
se eu me fizer
nele novo também.

Li uma vez que
não há caminho novo,
mas sim um
novo caminhar.

Silêncio.

Antes da virada:
faxina, adentrar os
porões de minha casa
e os porões do
coração-mente: faxina
e silêncio
observar o lixo jogado
fora
sem apegos nem
aversões.

Depois da virada:
faxina, adentrar os
porões de minha
casa e os porões
do coração-mente:
faxina em silêncio,
observar o lixo jogado
fora sem apegos nem
aversões.

Sorriso.

Se conseguirmos tirar
a raiva de nossa força,
conseguiremos reunir e
devidamente descartar
mesmo os mais fétidos
e desagradáveis resíduos
detritos, lixos e pedras
do caminho
sorrindo,
talvez.

Silêncio.

Li noutra vez
que estudar a si
mesmo é estudar
o ser humano, e
estudar o ser
humano é estudar
a si mesmo.

Há um eu e há
um outro?
O que difere a
casa do coração-mente?

Auspícios se fazem
bons, quando
do pensamento correto
em silêncio
brotam,

feito botão da primeira 
flor de ameixa.


Sem alarde, nem
selfie.

Silêncio.



*
Para as queridas monjas Shingetsu Coen Sensei e Waho Sensei.
Gasshô.

quinta-feira, 2 de março de 2017

desarmar



amor amado se deixa de amar?
é possível desamar?

desarmar, com ela aprendi, é.
desarmei-me, sorridente, aos poucos.
e como agradeço – a ela, a vida.
ao que fomos, e ao que hoje
posso ser.

confesso que dói a possibilidade
inegável e concreta
concreta
de que não mais seremos
elaeu.

tenho dificuldades de adentrar
as tretas
do âmago.

ouvindo
sweet nothing serenade
confesso que dói
saber do caminho dela
em que não há mais eu.

mas se com ela um dia
adentrei
não há sem ela
que me faça perder-me
da alegria que foi.

e porque foi,
é.
sigo-a levando em mim,
sem medo de chorar
sorrindo.